O Brasil que cabe no meu bairro
Quando penso no Brasil, penso primeiro no meu bairro. Não por egoísmo geográfico, mas porque é daqui que vejo o mundo. É das ruas que conheço pelo nome, dos rostos que encontro no caminho para a padaria, do cheiro do almoço que vem das janelas. É a partir dessa escala que minha ideia de país se forma.
O Brasil que me chega é filtrado pelo buraco da fechadura da minha vivência: o posto de saúde com fila de madrugada, a escola que luta para ter professores suficientes, o campo de futebol que sobrevive entre o mato e o concreto, as festas populares que resistem apesar da falta de apoio. Tudo o que não vejo de perto, imagino a partir das histórias que circulam entre vizinhos, da TV ligada no boteco, das redes sociais que misturam desinformação e relatos sinceros.
Esse recorte molda o que entendo por “Brasil”. Se no meu bairro a violência é diária, posso acreditar que o país inteiro vive em estado de guerra. Se aqui o transporte é precário, talvez eu ache que o problema é universal. Se vejo solidariedade nas pequenas ações — como dividir comida, acolher o vizinho que perdeu o emprego — posso concluir que o brasileiro é, antes de tudo, generoso. Mas será que essa leitura corresponde ao todo?
Nosso olhar é treinado pelo que nos cerca. Quem cresce em regiões com saneamento básico e ruas arborizadas tende a imaginar um país mais ordenado e justo. Já quem vive com esgoto a céu aberto, sem coleta de lixo ou iluminação pública, pode enxergar um Brasil marcado pela negligência e abandono. Essas percepções se refletem em nossas opiniões políticas, no voto, nas prioridades que defendemos e até nas notícias que escolhemos acreditar.
O perigo é transformar o bairro em sinônimo do Brasil. Um país continental como o nosso é um mosaico de realidades tão diversas que seria impossível caber numa única lente. Por isso, a empatia e a escuta ativa são ferramentas políticas. Quando me esforço para conhecer outras realidades — viajando, lendo, conversando com quem vive longe do meu CEP — amplio meu mapa mental do país.
O Brasil que cabe no meu bairro é real, mas é só um pedaço. Reconhecer essa limitação é o primeiro passo para imaginar um Brasil maior, que inclua a diversidade de bairros, cidades e modos de viver. É só quando juntamos esses pedaços que podemos, de fato, enxergar o país inteiro.
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