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Memória apagada: por que esquecemos nossas lutas?

Memória apagada: por que esquecemos nossas lutas?

A história oficial, aquela que se aprende na escola e se cristaliza nos livros didáticos, raramente dá conta da complexidade das lutas sociais no Brasil. Entre as ausências mais gritantes estão as trajetórias do movimento negro e das organizações comunistas, cujas contribuições para a democracia, para a conquista de direitos e para a transformação cultural do país são frequentemente minimizadas, distorcidas ou apagadas.

No caso do movimento negro, essa invisibilidade é ainda mais cruel. Apesar de séculos de resistência contra a escravidão, o racismo e a exclusão, muitas das vitórias conquistadas — do fim da escravidão formal à criminalização do racismo — não são apresentadas como fruto de organização e luta coletiva. A narrativa dominante prefere retratar essas mudanças como concessões generosas de elites, apagando figuras, grupos e estratégias que desafiaram a estrutura racista do país.

Com as organizações comunistas, o fenômeno é semelhante, embora com matizes diferentes. A luta pela jornada de oito horas, pelos direitos trabalhistas, pela educação pública e pela reforma agrária, em grande parte impulsionada por militantes comunistas e socialistas, é sistematicamente associada a “ameaças à ordem” ou tratada como parte de um passado que não merece ser resgatado. A repressão estatal, especialmente durante a ditadura militar, não só prendeu e matou militantes, mas também construiu uma narrativa de criminalização que ecoa até hoje.

O apagamento dessas memórias não é acidental. Ele serve a um projeto político que mantém as maiorias desmobilizadas e desconectadas de suas próprias tradições de luta. Se não conhecemos nossa história, fica mais difícil identificar as estratégias que funcionaram no passado, reconhecer nossos aliados e compreender que os direitos de hoje foram conquistados com sangue, suor e organização.

O resgate dessas memórias é mais do que um ato de justiça histórica: é uma ferramenta para o presente. Quando lembramos das alianças entre movimentos negros e comunistas, das greves operárias que se cruzaram com marchas antirracistas, percebemos que a força das mudanças sociais no Brasil esteve, muitas vezes, na união de pautas que os poderes tentaram separar.

Esquecer nossas lutas não é apenas um descuido; é uma vitória dos que querem manter as coisas como estão. Por isso, precisamos produzir, registrar e ensinar nossas próprias narrativas, para que as próximas gerações não precisem reinventar a roda toda vez que a história ameaçar se repetir.

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